sexta-feira, 25 de março de 2011

Os mais secretos desejos.

Se “querer” fosse uma fita de cetim, junto ao “sentir” elas formariam um laço? Ou formariam um nó?

Querer-te é como ter um nó em meu peito. Um nó apertado e sufocante. Deixei de sentir teu amor. Aquele que em palavras doces e remendadas prometestes a mim. Convicta de que passaria, a vontade de acreditar “somente essa vez” tornava-me confusa. E entre os mundos...
Querer-te esteve no centro. Cada milímetro do meu corpo implorava “só uma vez, só uma vez”. E se acreditássemos? Deixa que tudo fique incerto. Finja, apenas hoje, que nada poderia ser feito. Escreveram isso e, de qualquer modo, deram o querer só a mim. O querer que não passa; amargo.

Querer que queira-me como quero-te, como quero-te em tudo, como te encontro em cada fragmento. Como o verdadeiro sorrir só existe quando quer-me, quando deseja-me, quando procura-me. Ele não existe mais.

De ti, alegraria-me apenas um sorriso. Uma risada. Um olhar. Mas, o que realmente quero, poderias me dar? O teu coração... Ele é meu?

sábado, 12 de março de 2011

Marcas.

“Há seis meses atrás, resolvi ir à biblioteca. Não que isso fosse incomum, frequento-a desde os meus sete anos e apenas lá tive as experiências mais loucas e incríveis da minha vida. Tenho uma pasta de anexos dos meus desenhos que representam livros. Mas não imagine que quando li O Pequeno Príncipe copiei as representações que lá estavam. Fiz desenhos pouco geniais, bateu-me a insegurança de nunca ter a facilidade para desenhar tão bem quanto no livro; ou que a prática fosse em vão. O hábito de desenhar está nas minhas lembranças mais antigas, de quando ver televisão sem ter o que rabiscar era inútil a mim. Não sei ao certo o que me estimulou e é isso que me faz continuar. É claro que um hábito que gosto e há tantos tenho não passaria assim, do nada. Como pessoa pouco persistente que sou, orgulho-me de ter tantos desenhos assim. Poucas vezes terminei realmente alguma coisa. Nunca tive muita paciência para amizades e isso só doeu quando eu fiz um amigo. Foi no dia da biblioteca. Ele tinha os cabelos castanhos, eles eram curtos e suas pontas faziam leves ondas. Mar. Seus olhos eram da mesma cor e sua pele era branca. Vestia uma blusa maior que o seu tamanho, aparentava ter um físico normal. Não ocorreu-me de que a pouco estava a sair da adolescência, parecia ter apenas quinze anos. Intrigou-me o livro que carregava: Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo. Sem pensar, fui e disse a ele: “espero que goste tanto quanto eu!”. Após as palavras terem saído da minha boca tive a certeza de ter corado na hora e então virei as costas e saí, sem mais nem menos. De noite só conseguia desenhar quadrados e até mesmo acabava rabiscando de ódio. Ódio de mim, o que tinha sido aquilo? Quando foi a última vez que tinha falado com um desconhecido? (Que após me acharia uma completa idiota). Fiquei me amaldiçoando e tendo que fugir do caminho da biblioteca por uma semana para tentar superar aquilo. Mas então chegou o dia da entrega e dessa vez eu não escapava, estava com um livro novo e era certo que outras pessoas também gostariam de ler. Já tinha terminado, ligar para aumentar o prazo seria egoísmo. Saí da aula e fui direto à biblioteca com a esperança de que o menino-mar não estivesse lá. Sim, eu havia inventado até uma maneira de chamá-lo. A vergonha foi tanta que só entrei, deixei o livro e pedi para a bibliotecária guardar. Mas ao sair... Não era possível. Juro que havia tratado de levantar e colocar o pé direito no chão primeiro, cruzado os dedos umas dez vezes só enquanto estava ali, de nada adiantou. “Superstições toscas”. Tentei ir para o outro lado da escada, mas ele parecia me olhar. Talvez tinha algo a dizer ou era apenas para ver meu rosto corado e rir até perder o fôlego depois. Pensando na segunda hipótese, comecei a tremer. Raiva? Mas ele ainda não tinha feito nada. Olhei para o céu e não pensei para relaxar. Ele estava ao meu lado e ouvi um “ei” e não! Não podia ser comigo! Céus, mas era comigo! Foi só olhar ao lado que enxerguei um sorriso largo e tive de me apoiar para não cair. Não me interprete mal: a timidez era uma tremenda madrasta comigo. “Espera um minutinho?”, sem pensar duas vezes já estava balançando a cabeça que sim, eu esperaria. No meu consciente era hora de correr, mas algo me fez esperar. Tive que respirar calmamente três vezes até parar de tremer. Ele voltou, foi mais rápido do que desejei. “Não me importaria se ficasse por lá”, pensei. Surpreendentemente ele ainda estava sorrindo e ao chegar mais perto disse-me que era só para contar que havia gostado do livro e a moreninha acabava por lembrar a mim. Então quis saber mais e perguntei “como?”, pois não sabia se havia entendido direito. “Sabe quando imaginamos uma pessoa para determinado personagem? Não sei com você, mas comigo é sempre assim... Se por algum motivo o personagem me lembra alguém que conheço, eu a imagino como a personagem. Então ela deixou de ser a Carolina e tornou-se você! Embora nem o seu nome eu saiba”, então ele riu e incrivelmente eu ri também. Ri como se o conhecesse e ele não fosse apenas o menino-mar. A vontade de mergulhar foi inevitável... E foi assim que tudo começou. Aos poucos descobri que seu nome é Marcelo e que coincidência! Menino-mar, Marcelo. Mas não o chamei assim depois, temos apelidos para cada situação. Quando estamos com alguém o chamo de Ma e ele me chama de Li, sozinhos o chamo de Elo e ele me chama de Lyddi. Ele sabe sobre meus desenhos mas é raro contar o significado de uma coisa ou outra. Eu não sabia que uma pessoa poderia me proporcionar tanto prazer com pequenas coisas. Um abraço, uma risada, uma palavra que inventamos e até mesmo um olhar que acaba em risadas, isso tudo faz sentido hoje. Porque são como marcas e eu as adoro.
Acreditar que algo vai permanecer em sua vida é mágico. E só não é real se você não acreditar.
(Mar, marcas, Marcelo.
O destino criou um elo.
Mar, marcas, Marcelo, magia.
Um dia farei tua biografia.
É proibido cortar nosso laço,
Esteja no calor do meu abraço.)”
Lydia.

Do verbo “desenhar”.

“Se eu tivesse papel e lápis agora, desenharia um círculo e traços saindo dele. Esse círculo seria o que estou vendo: um casal de idosos. Eles andam de mãos dadas como se isso soasse uma música aos ouvidos de quem os vêem. Transbordam serenidade, inocência e jovialidade. Os traços representariam justamente isso, a canção de duas vidas. Almas sem rugas, jamais envelhecidas pelas dificuldades do passado.
Mamãe sabe muito bem o quanto gosto de desenhar, se aborrece quando estamos em algum local e eu ignoro tudo na primeira oportunidade e sento para fazê-lo. Então quando voltamos a caminhar e temos o nosso pequeno diálogo “você parou para desenhar isso, Lydia?” “sim mamãe, não é lindo?”, ela faz que sim com a cabeça e eu sei que aquilo não faz sentido algum a ela. Somente ─ e sempre ─ a mim. Certo dia ao fazer um rabisco em minha parede ela foi me chamar para jantar. Me pegou no pulo e sem pensar duas vezes começou: “mas que diabos é isso agora? Riscando até a parede, senhorita? Não ache que eu e o seu pai vamos pagar para alguém tirar essa coisa horrorosa depois. Trate de limpar ou ficará assim até você começar a trabalhar e pagar com seu dinheiro!”, dei de ombros: “tudo bem, mamãe”. Isso mesmo, mamãe não sabe o que há atrás de cada ─ o que ela julga ─ “risco”. E prefiro que, por enquanto, só eu saiba.
Neste mesmo dia da parede, ela resolveu falar pro papai e acabou fazendo-me subir mais cedo que o normal. Ele não dá a mínima para pequenas coisas, mamãe sabe disso e tenta fazer com que papai se importe, após inúmeras tentativas em vão se irrita e resolve me irritar para não se sentir solitária. O certo é que isso rende alguns desenhos que em sua maioria são tentativas de fazer uma espada. E aí meu pensamento vai a épocas que me recordo mas não vivi. Leão, espadas e armaduras: uma guerra em minha cabeça. Aos poucos a mente cansa e volto a desenhar, por vezes ursos ou bigodes.
(Ir ao fundo, profundo,
Sono, mergulho.
Desenhos. O mar, tão fácil de desenhar.
Difícil é nadar.
Tudo, sentido, nada.
Procura-me ela, encontra o vazio.
Um dia uma carta te envio.)”
Lydia.